Os dois mestres mais influentes da capoeira e seu legado que...
Os dois mestres mais influentes da capoeira e seu legado que vive hoje: Pastinha e Bimba
Mestre Pastinha: A Preservação da Angola e a Filosofia da Malícia/Sagacidade
Vicente Ferreira Pastinha, nascido em Salvador em 1889, é o grande mestre da Capoeira Angola, estilo que enfatiza a tradição, a malícia, a musicalidade e os aspectos culturais e históricos afro-brasileiros. Pastinha aprendeu a capoeira ainda criança com um africano chamado Benedito, que lhe ensinou não apenas os movimentos, mas a filosofia de transformar conflitos em aprendizado e respeito.
Principais Contribuições e Legado:
1. Sistematização da Capoeira Angola: Pastinha organizou e codificou os princípios da Capoeira Angola, destacando a ginga, a malícia (astúcia), a musicalidade e o jogo baixo e próximo ao chão. Ele fundou o Centro Esportivo de Capoeira Angola (CECA) em 1941, no Pelourinho, Salvador, que se tornou um espaço de resistência cultural e formação de mestres.
2. Ativismo Cultural e Resistência: Pastinha lutou contra a criminalização da capoeira (que era proibida pelo Código Penal até os anos 1930) e trabalhou para valorizá-la como patrimônio cultural. Sua escola formou discípulos ilustres como João Grande e João Pequeno, que disseminaram a Angola globalmente.
3. Escrita e Documentação: Pastinha foi um "capoeira-autor", escrevendo manuscritos, canções (ladainhas) e livros como Capoeira Angola (1964), onde registrou sua filosofia. Ele também mantinha um livro de registros do CECA, documentando a memória do grupo e seus membros.
4. Influência Global: Pastinha representou o Brasil no Primeiro Festival Mundial de Artes Negras em Dakar (1966), levando a capoeira para o mundo. Seus discípulos, como João Grande, abriram escolas nos EUA e Europa, garantindo que a Angola permanecesse viva como uma prática de resistência negra.
Apesar dos desafios pessoais, como a perda do CECA e problemas de saúde em seus últimos anos, Pastinha deixou um legado de resistência, dignidade e preservação cultural. Sua filosofia é celebrada em projetos como "A Roda de Capoeira da Eduardo Ribeiro" no Amazonas, que homenageia seu aniversário e promove a Capoeira Angola.
Mestre Bimba: A Revolução da Regional e a Institucionalização
Mestre Bimba, nascido em Salvador em 1899, revolucionou a capoeira ao criar a Capoeira Regional, um estilo mais dinâmico, acrobático e eficiente como arte marcial. Preocupado com a marginalização da capoeira, Bimba a transformou em uma prática respeitável e acessível a todos os estratos sociais.
Principais Contribuições e Legado:
1. Criação da Capoeira Regional: Bimba misturou elementos da Capoeira Angola com movimentos do batuque (luta africana) e golpes de outras artes marciais. Desenvolveu um método de ensino estruturado, com sequências de movimentos e um código de ética que exigia disciplina, higiene e bom comportamento.
2. Legalização e Reconhecimento: Em 1928, Bimba desafiou a proibição da capoeira e, após uma apresentação para o governador Juracy Magalhães, conseguiu sua legalização na década de 1930. Em 1932, fundou a primeira academia de capoeira do mundo, a Academia-Escola de Cultura Regional, em Salvador. Em 1953, o presidente Getúlio Vargas declarou a capoeira "o único esporte verdadeiramente brasileiro" após uma demonstração de Bimba.
3. Sistematização e Rituais: Bimba introduziu rituais como a charanga (orquestra de berimbau e pandeiros), cantigas específicas, e o batizado (cerimônia de formatura). Seus alunos usavam uniformes brancos e lenços coloridos indicando graduação, práticas ainda hoje universais na capoeira.
4. Globalização e Influência: Bimba abriu as portas para a capoeira ser praticada por todas as classes, incluindo artistas, políticos e intelectuais. Seu estilo dinâmico influenciou diretamente a capoeira contemporânea e indiretamente outras artes, como o breaking, devido a seus movimentos acrobáticos.
Bimba faleceu em 1974, mas sua Regional é hoje a vertente mais praticada globalmente. Seu método de ensino é base para academias worldwide, e seu foco na eficiência marcial e no respeito social transformou a capoeira em símbolo da cultura brasileira.
Legados Interligados e Vivos Hoje
Embora Pastinha e Bimba representem estilos diferentes da Angola (tradicional, lenta e maliciosa) e Regional (dinâmica, acrobática e marcial) seus legados se complementam e formam a base da capoeira moderna:
- Preservação vs. Inovação: Pastinha manteve viva a tradição africana, enquanto Bimba adaptou a capoeira aos novos contextos sociais. Hoje, muitas escolas praticam ambos os estilos, reconhecendo a importância dessa dualidade.
- Influência Global: Discípulos de ambos os mestres, como João Grande (Angola) e Jelon Vieira (Regional), levaram a capoeira para o mundo. Jelon, por exemplo, abriu a primeira escola de capoeira fora do Brasil em Nova York (1975) e influenciou diretamente o breaking.
- Cultura Viva: Projetos como o "Rede Capoeira" na Bahia homenageiam esses mestres, enquanto academias de Piracicaba a Bruxelas mantêm vivos seus ensinamentos. Mestres como Cosmo (discípulo de Miguel Machado) enfatizam a elegância do jogo e a resistência negra, ecoando Pastinha, enquanto a Capoeira Regional domina as competições e eventos esportivos.
- Reconhecimento Institucional: A capoeira foi reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO em 2014, um feito impossível sem as contribuições de Bimba (que a tornou respeitável) e Pastinha (que preservou suas raízes).
Conclusão: Viva Pastinha! Viva Bimba!
Vale lembrar que amizade entre eles dois era muito linda!
LIVRO - "#Pastinha, O grande mestre da #Capoeira Angola", escrita pelos jornalistas José de J. Barreto e Otto Freitas pic.twitter.com/xbhRUpFfNg
— Iê Camará Capoeira (@iecamarabahia) April 5, 2025
Pastinha e Bimba são nossos pilares indissociáveis da capoeira. Seus legados transcendem estilos: representam a resistência negra, a criatividade cultural e a luta por dignidade. Hoje, quando capoeiristas de todos os países gingam nas rodas ao som do berimbau, eles celebram a visão desses dois mestres imortais, que transformaram uma prática marginalizada em uma herança global de liberdade e identidade.
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