Cartas do Jesuíta Antonio Gonçalves para os superiores de Lisboa, em 1735, descreve um luta que os índios praticavam antes de qualquer conflito, em forma de roda dois a dois usando os braços, pernas, cotoveladas, joelhadas, e usando todo corpo como armas (convento de Santo Inácio de Loyola, anais das missões no Brasil. Tomo III pág. 128)
O escrito Holandês Gaspar Barleus descreve no livro "Rerum Per Octenium in Brasília-1647, a luta dos índios tupis praticada no litoral brasileiro" chamado de maraná, luta de guerra, só existem dois exemplares, um no EUA e outro no Brasil.
O cronista alemão Johann Nieuhoff descreve em seu livro "Crônicas do Brasil Holandês" 1670, a luta do maraná assim com descreve em baixo:
Maraná a Dança da Guerra
As cartas do escrivão Francis Patris, que acompanhava o cortejo do príncipe Mauricio de Nassau durante a invasão Holandesa, descreve entre muitos obstáculos para a ocupação do território brasileiro a resistência dos Habitantes do Brasil.
Negros comandados por Henrique Dias, portugueses por Vidal de Negreiros, Índios Potiguares comandados por Felipe Camarão, o "Ìndio Poti". Esses índios usavam durante o confronto, alem de flechas borduna, lanças e tacapes, os pés e as mãos desferindo golpes mortais, destacando-se por sua valentia e ferocidade.
Pertencia a cultura potiguara a dança e guerra Maraná, que avaliava o nível de valentia. Em círculos, os guerreiros com perneiras de conchas compunham um compasso ao bater com os pés e as mãos, invocando seus antepassados, acompanhado de atabaques de troncos com pele de Anta, chocalhos e marimbas, em quanto que dois guerreiros se confrontavam ao centro com golpes de pernas, cotoveladas e movimentos que imitavam os animais.
Quilombo dos Palmares
A maior resistência socioeconômica e política da história do Brasil, quase cem anos lutando pelo direito á vida e á liberdade, na Serra da Barriga, em Pernambuco hoje Estado da Alagoas. Em 1650, um grupo de escravos se
rebelou no engenho de Pianco, Capitania de Pernambuco, liderada pelo Príncipe Negro Angolano "Zumba" que os conduziu para o Alto da Serra da Barriga, onde ficava a aldeia de nação Potiguar "Palmares", liderada pelo cacique Canindé e a Xamã Akutirene. A velha feiticeira previu que o certo dia surgiria de grande rio um grande Rei que imortalizaria Palmares. Com sua grande liderança foi eleito Rei "Ganga" de Palmares. Dentro de poucos anos a população negra passou 70%, a dos principais quilombos, que ao todo foram oito (Amaro, Akutirene, Macaco, Aqualtene, Danbraga, Subupira,
Adalaquituxe), 25% de Índios e 5% de Portugueses Brancos foragidos (Mestiços, portugueses, Franceses e Espanhóis). Toda essa miscigenação racial criou uma nova cultura étnica, religiosa, dialeto, capoeira, culinária, relações, culturais onde a terra era patrimônio de todos e as decisões de ganga eram decididas pelo concílio dos anciões Zama, que representava os patriarcas de cada família. Palmares foi a maior republica socialista de América, formava um arco-íres racial do povo Brasileiro (Negros, Mamelucos, Índios, Cafuzos, Sararás, Mulatos e Brancos e etc.) nessa sociedade surgiu à capoeira com a fusão das culturas negras, indígenas e brancas. O negro contribuiu com o N'Golo, a ginga, mandinga, com seus instrumentais, pandeiro quadrado, atabaque Islâmico, agogô e mais tarde o berimbau (urocongo). Os Índios com as marimbas, xererê, atabaque de tronco oco e pele de anta, com movimentos que imitavam os animais.
Ouviu-se falar de capoeira pela primeira vez durante as invasões holandesas, em 1624, quando os índios, e Negros escravos, (as duas primeiras vitimas da colonização). Aproveitando-se da confusão gerada, fugiram para as matas, aumentando o contingente dos Quilombos dos palmares onde o primeiro rei "ganga" Chamava-se Zumba; Salientamos que o primeiro Quilombo registrado foi em
Pernambuco(Cumbi) no ano de 1558.
Em 1678 foi Regis trado a chegada de Ganga Zumba, Rei dos Palmares, ao recife. Onde foi recebido pelo então Governador Souza de Castro; Por várias vazes Ganga-Zumba com seus Guerreiros Maus vestidos chegaram a Recife, convidado pelo Governo de Pernambuco a respeito de muitos Escravos fugirem para Os Quilombos, deixando grandes prejuízos para os Fazendeiros, que precisavam da monocultura Escrava; do acordo firmado entre Zumba e o Governo Constituinte, nada foi cumprido por parte do poder Constituído. Também durante uma dessas visitas Ganga-Zumba foi envenenado Pelos seus Próprios Colaboradores manipulados pelo Governo Pernambucano. Zumbi: Assumindo o comando o Guerreiro Zumbi que quando criança havia sido raptado por Bandeirantes ou Caçadores de Escravos e criado por um Padre em Recife, que aos 15 anos já era coroinha, e aos 25 anos fugiu para os Quilombos dos Palmares ficando no lugar de Ganga-Zumba mais foi morto no dia 20 de Novembro de 1695 pelo perverso Domingos Jorge Velho, a sua cabeça foi colocada em sal e enfiada em um poste na frente da Igreja do Carmo para mostrar a seus seguidores que seu defensor havia sido vencido, hoje existe o monumento do mesmo, e a data de sua morte é comemorada o dia da Consciência Negra, Segundo a Lenda Zumbi era um nato lutador de capoeira. O Reinado de Zumbi Durou 14 anos.
A Capoeira é Considerada a Arte Marcial Brasileira pelo motivo de ser utilizada de muita forma como as Maltas, Guerra do Paraguai, Revoltas dos Mercenários, nas caramussas entre monarquia e republicanos, Guerra das Tabocas, Mascates, Guardas costas de José do Patrocínio e Dom Pedro 1, Canudos, Farrapos, Primeira e segunda Guerra Mundial, ETC...
A fusão
Com base no nome capoeira ser de origem tupi-guarani, (mato ralo que foi cortado) e que toda cultura África tem os seus nomes em idiomas africanos, como também as danças indígenas brasileiras são de forma de passadas idêntica a ginga da capoeira com "pé para frente e pé para traz". "As lutas africanas são movimentadas lateralmente ou em formas de pulos altos, e só viram de frente na hora de dar cabeçadas contra o peito do outro que desejam derrubar, acontece-lhes chocarem-se fortemente cabeça contra cabeça, o que faz com que a brincadeira não raro degenere em briga e que as facas entrem em jogo ensanguentando-a".- JOÃO MAURÍCIO RUGENDAS-"Viagem pitoresca através do Brasil" 1834
a 1839, Biblioteca Histórica Brasileira, Liv. Marins Editora. São Paulo, 1954. Pág. 197. Sem nenhuma identidade com a capoeira, o berimbau aparentar a forma de um arco e fecha muito usado pelos Indígenas. Salientando que os africanos nunca perderam sua identidade, nem seu dialeto sofreu nenhuma
Também Observando várias dúvidas dos folcloristas, pesquisadores e historiadores, tenho a certeza de que a Capoeira é a Fusão do N"Golo, trazida da África e o Maraná, existente no Brasil antes do Descobrimento, nascida nos Quilombos dos Palmares, Capitania Hereditária de Pernambuco. Aqui vão alguns exemplos: no livro "arte da gramática da língua mais usada na costa do Brasil" publicado em 1595 onde o padre José de Anchieta, cita que os índios Tupi-guarani, divertem jogando capoeira; Guilherme de Almeida, no livro música do Brasil, sustenta serem indígenas as raízes da capoeira; o Navegador Português Martins Afonso de Souza, observou tribos jogando capoeira. Um trabalho publicado pela xerox do Brasil, o professor austríaco Gerhad Kubik, antropólogo e membro da associação mundial do folclore, e profundo conhecedor de assuntos africanos, diz estranha que o brasileiro chame "Capoeira de Angola, quando ali não existe nada semelhante.
Conclusão: A capoeira é Afro-Brasileira, pelas provas documentadas de 1624 na Invasão Holandesa, e usada na fuga de Escravos Africanos para o Quilombo dos Palmares.
esquinas "sem motivos manifestos" e "da assobios ou outro qualquer sinal" Esses assobios eram obtidos com as pontas dos dedos mínimos colocados nos lábios(assobios grave, flautas de madeira) ambos praticados pelo meu Pai, Bianor de Oliveira( discípulo quando rapaz de Nicolau do poço), para chama, de longe, os filhos, utilizando tais recursos, os capoeiras avisavam-se uns aos outros, da proximidade da policia, sobre tudo se tratava-se de cavalaria, que respeitavam. Ou valiam, simplesmente, como ordem de debandar, em caso de derrota eminente, em algum entrevero.
Antigos Valentes da Capoeiragem Recifense
A nossa capital a largos anos passados era conhecida como terra dos "faquistas", ou Capoeiristas. Os desconhecidos perambulavam pelas nossas principais ruas, conduzindo armas ostensivamente e praticando crimes sem que houvesse para eles a menor punição, porque dispunham da proteção de certos chefes políticos, aos quais serviam de capangas, principalmente nas épocas de eleição. Não havia segurança de espécie nenhuma para o povo. A vida de um cidadão desaparecia de um momento para outro. Matava-se diariamente nesta cidade. Muitos eram assassinados por motivos frívolos. Estavam em evidencia os valentes: Hoje relatamos trechos da história de José do Nascimento da Silva, o capoeira Nascimento Grande, nascido no Recife em 24 de Dezembro de 1842 que foi entre os homens valentes daquela época, o mais respeitado e popular. O primeiro destes, já nos seus oitenta anos de idade época da foto ao lado, foi agredido na cidade de Vitória do Santo Antão por um grupo de Afamados (Brabos) constituído por Cosmo Pretinho, Apolônio da Capunga, Ascenço e Corre-Hoje e, num movimento de legitima defesa, fez tombar, atingido por uma bala na boca. Em toda vida de
Nascimento Grande, podemos afirmar, foi a única vez que recorreu a arma de fogo, em virtude de sua idade avançada que não lhe permitiu a agilidade de sempre, pois com sua bengala afamada, fez correr inúmeros valentes, fazendo certa vez, cair por terra, o celebre Sabe-Tudo, num encontro que teve com este na antiga Pracinha, atualmente Praça da Independência.
Os pontos preferidos pelos perturbadores da ordem pública eram os bairros de Santo Antonio, São José e Afogados e o subúrbio da Torre, Madalena e Poço da panela.
A mais notável façanha de Nascimento Grande, o "brabo dos brabos", vem do tempo em que Barbosa Lima era governador de Pernambuco.
Havia a Cambôa do Carmo, u'a mulata de estouro, chamada Luiza. Certo comendador, chefe de importante de firma comercial desta praça, era o forte dessa mulher. A' mundana, não eram indiferentes a robustez e valentia de Nascimento. Ciente o comendador, do que se passava, todo cheio seu poder monetário e suas relações políticas, foi-lhe fácil aliciar um soldado do antigo esquadrão de cavalaria, para que desse uma lição em Nascimento. O soldado foi alem das ordens recebidas, preferindo matar Nascimento a aplicar-lhe uma sova (Surra), (para o que se sentiu pequeno).
Certo dia, em plena tarde, Nascimento demora á janela da casa de Luisa, quando o aliciado lhe desfecha dois tiros de (Comblaim,) sem resultado. As balas quebraram apenas as rotulas das janela. Perseguindo o agressor pelo agredido, foi por este alcançado alem do Pátio do Carmo, no ingresso da rua de Santa Tereza. Desfez-se o soldado em lamuria, declarando que aquilo não era obra sua, mas do Comendador F... – Dá-lhe Nascimento uns safanões, mandando-o em paz.
Dia seguinte Nascimento monta em seu cavalo e foi até lingüeta, ponto de reuniões dos expoentes comerciantes do Recife. Lobrigado Nascimento pelo comendador que ali se achava, dá este uma marcha para um banco que ficava á rua do comercio, onde Nascimento, á porta, dá umas boas cipoadas, montando depois serenamente em seu cavalo que trans portou até a rua cãs Cruzes, onde morava no 1º Andar, aquele tempo de numero 14, foi um escândalo da época. Poderosos intervieram para que Nascimento fosse afastado de Pernambuco, mas não conseguiram, o afastado voluntariamente foi o comendador, que não mas voltou em Recife, esta passagem da vida de Nascimento, só os Velhos do Recife estão no seu domínio. Não invocamos testemunhas para não melindrar raízes das velhas famílias importante do Recife. Caso interessante da vida de Nascimento. Também possuía duas Bengalas, a primeira de castão de prata e madeira, a segunda um rústico cipó-pau. Da primeira fazia uso quando vestia o seu melhor traje – da segunda fazia de vagações noturnas.
Este fato é mais recente, deu-se no ano de 1902. Em Casa Forte havia um bilhar onde a noite se jogava Lasquinet. Tomavam parte neste jogo pessoas de distinção. Nascimento era parceiro para aquele Arrabalde, onde se dirigia sempre de trem de 6 e 32 da linha principal. Esta, certo dia, nesse viajava sentado num banco próximo á porta de um dos carros de 2º classe. Parado e trem na Jaqueira, logo em seguida foi dado o sinal de partida. Já em movimento um forte Negro tentou alcança-lo com verdadeira imprudência. Seria vitima se não fora Nascimento com sua agilidade de felino e sua força segurando a vitima por um braço, já desequilibrado, sacudindo para dentro do trem, o Preto machucou-se um pouco. Nascimento se deixou ficar como se nada houvera, no seu lugar ocupado desde Recife. Passado um instante o Negro rompeu em impropérios contra nascimento, que nada lhe respondeu no curto trajeto da Jaqueira para o Parnamirim, o Preto disse mais desaforos a Nascimento que uma remeira sempre irritada poderia dizer num ano. Nascimento impassível. Parado o trem em Parnamirim. O Preto passou em sua frente depois de lhe dirigi uma expressão grosseiriscima – Salta Nascimento e aplica duais boas cipoadas no Preto e logo uma terceira, fez cair dentro da venda de Francisco de tal, bem em frente a Estação – grita sº Francisco: Nascimento não faça isso, a esta voz o Negro se levanta, e diz : - Eu não sabia que era Nascimento. Tudo isso aconteceu no instante, de vez que Nascimento ainda tomou o mesmo trem com destino á Casa Forte. Chegando a Faleceu aos 94 anos em 1936, que Gilberto Freire por ocasião da morte deste Capoeira, reclamou ao governo sua Homenagem.
Bibliografia: Recife Sangrento. Trechos do Livro Inédito sobre História de capoeira no Recife do Século XIX, de Bernardo Alves. Câmara Cascudo. José mariano. José Lins do Rego
Por Matthias Röhrig Assunção e Mestre Cobra Mansa pelo site da Revista de História
|
Elo Perdido
Seria o n'golo, jogo ritual praticado em Angola, o ancestral da nossa capoeira?
Por Matthias Röhrig Assunção e Mestre Cobra Mansa pelo site da Revista de História
A origem da capoeira sempre foi controvertida.
Mestre Pastinha (1889-1981), um dos mais famosos capoeiristas da Bahia,
durante muito tempo pensou que a ginga que aprendera desde criança
provinha de uma mistura do batuque angolano e do candomblé dos jejes,
africanos da Costa da Mina, com a dança dos caboclos da Bahia. Mas, por
falta de mais conhecimentos, não podia ir muito além dessa afirmação.
Isso até a
década de 1960. Foi quando uma revelação mudou completamente suas
idéias sobre as origens da capoeira. À frente de sua academia, situada
no Pelourinho, em Salvador, Pastinha recebeu a visita de um pintor vindo
de Angola. Chamava-se Albano Neves e Sousa e afirmava que tinha visto
na África uma dança semelhante ao tipo de capoeira que o mestre baiano
ensinava. Só que lá chamava-se n’golo.
Até então, ninguém por aqui tinha ouvido falar de nada semelhante.
A memória oral não registrava nenhuma prática ancestral específica.
Muitos afirmavam, e continuam afirmando, que a capoeira teria sido
inventada pelos escravos nas senzalas. Outros, que teria sido criada
pelos quilombolas em sertões distantes. Estudiosos têm ressaltado o
caráter urbano da capoeira, pois as fontes do século XIX só documentam
sua prática por escravos africanos e crioulos (negros nascidos no
Brasil) em cidades portuárias, como Rio de Janeiro e Salvador. Naquela
época, era uma “brincadeira” proibida, e a grande maioria dos africanos
presos por “jogar” capoeira no Rio de Janeiro era originária da África
centro-ocidental, das “nações” Congo, Angola e Benguela. Em Salvador, a
capoeira também era identificada como uma “brincadeira dos negros
angola”. Por essa razão, faz realmente sentido buscar as raízes da
capoeira na região dos atuais Congo e Angola.
O n’golo, explicou Neves e Sousa ao
velho capoeirista, é dançado por rapazes nos territórios do sul de
Angola, durante o ritual da puberdade das meninas. Chamado de mufico,
efico ou efundula, esse ritual marca a passagem da moça para a condição
de mulher, apta a namorar, casar e ter filhos. É uma grande festa em que
se consome muito macau, bebida feita de um cereal chamado massambala. O
objetivo do n’golo é vencer o adversário atingindo seu rosto com o pé. A
dança é marcada pelas palmas, e, como na roda de capoeira, não se pode
pisar fora de uma área demarcada. N’golo significa “zebra” e, de fato,
alguns movimentos, em particular o golpe dado pelo pé, de costas e com
as duas mãos no chão, parecem mesmo com o coice de uma zebra.
Os registros e a argumentação de
Albano eram bastante convincentes. Se os africanos escravizados nas
Américas lograram, apesar de condições terrivelmente adversas, adaptar
suas religiões e seus rituais, assim como suas festas e danças de
umbigadas, não seria lógico que também trouxessem para cá seus jogos de
combate e suas artes marciais? Sabe-se que os exércitos congolês e
angolano eram formados por guerreiros exímios na luta corporal. Vários
cronistas destacaram a habilidade com que eles evitavam golpes, jogando o
corpo para o lado de maneira imprevisível e confundindo o adversário.
Ainda que
muitos dos africanos escravizados conhecessem as artes da guerra, a
maioria se dedicava à agricultura ou à pecuária antes de ser aprisionada
e embarcada à força para as Américas. Os povos pastores de Angola, em
particular, por causa da necessidade de proteger o gado que tangiam
contra eventuais gatunos, desenvolveram técnicas de combate
individuais, sabendo manejar paus e outras armas contundentes contra os
inimigos.
Os cronistas coloniais não forneceram descrições pormenorizadas das técnicas
nem dos rituais desses antigos jogos de combate, o que torna impossível
qualquer tentativa de aproximá-los da capoeira como hoje a conhecemos.
Os significados culturais desses rituais também mudaram ao longo dos
séculos, acompanhando a intensa transformação socioeconômica e cultural
por que passou a África a partir do século XVII. Até as fronteiras
étnicas foram redesenhadas antes que se chegasse à configuração atual.
Assim, todas as manifestações que porventura existem hoje em Angola são
expressões contemporâneas, e só têm relações tênues com os jogos de
combate do tempo do tráfico negreiro.
Infelizmente,
Mestre Pastinha (ver box), por ocasião da visita de Albano Neves e
Sousa, já estava com a vista comprometida por uma catarata – aliás,
nunca operada por falta de recursos. Isso limitava muito qualquer plano
seu de divulgar a recente descoberta. Chegou a contar a história que
ouviu para seus alunos mais próximos, mas não deixou nenhum registro
escrito sobre o n’golo. Nem seu livro Capoeira Angola, publicado pela
primeira vez em 1964, nem seus diversos manuscritos, por serem
anteriores ao encontro com o pintor luso-angolano, mencionam a “dança da
zebra”. Mas Albano Neves e Sousa conseguiu convencer outros brasileiros
de sua teoria, entre eles o então presidente da Sociedade Brasileira de
Folclore, Luís da Câmara Cascudo (1898-1986).
De volta a Angola, Neve e Souza organizou, em 1966, a exposição “...Da minha África e do Brasil
que eu vi...”, com o material de suas viagens aos países de língua
portuguesa dos dois lados do Atlântico, apontando semelhanças entre
expressões culturais africanas e dos negros brasileiros. No prefácio do
catálogo da exposição, Câmara Cascudo mencionava que o pintor “viu a
ginástica do n’golo, batizada em ‘capoeira’”. O renomado folclorista
seria o primeiro a divulgar no Brasil a teoria do n’golo como luta
ancestral da capoeira. Ele conhecera Albano Neves e Sousa durante uma
viagem a Angola em 1963, e daí nasceu uma amizade cultivada por
correspondência durante muitos anos.
Depois de sua viagem ao Brasil e de seu encontro com a capoeira, o
pintor explicou a Cascudo, numa longa carta, suas idéias sobre as
origens dessa arte. O folclorista potiguar encampou a teoria, tanto que
citou longos trechos da carta do pintor no seu livro Folclore do Brasil
(1967) e incorporou a explicação no seu Dicionário de Folclore (1972, 3ª
ed.). Baseado nas informações fornecidas pelo amigo, Cascudo deu mais
detalhes sobre a dança da zebra e sua trajetória até se transformar em
capoeira. Explicou que o n’golo seria típico entre os povos pastores do
sul de Angola. O ritual era precedido por uma luta de mãos abertas, a
liveta. O jovem que ganhasse no n’golo teria o direito de escolher sua
noiva entre as meninas recém-iniciadas, sem ter de pagar dote. Cascudo
sugeriu que o n’golo teria chegado ao Brasil através do porto de
Benguela.
Aqui,
essa tradição tribal se transformara em instrumento de defesa e ataque
de bandidos. Na edição, ele incluiu três desenhos do n’golo, feitos por
um artista de Natal com base na obra de Neves e Sousa. Os esforços
conjuntos do pintor, do folclorista e do velho capoeirista para resgatar
o vínculo ancestral ligando a capoeira a Angola acabaram dando
resultado.
Os desenhos originais de Neves e Sousa só foram publicados em 1972, num livro com o mesmo título da exposição de 1966. A epígrafe é significativa: “Digam o que disserem... Se Portugal foi o Pai do Brasil, Angola foi a Mãe Preta que o trouxe ao colo!” Reúne elaborados a partir dos esboços e aquarelas feitos no campo durante vinte anos, acompanhados de pequenos textos explicativos.
Algumas imagens evidenciam semelhanças surpreendentes entre
a capoeira e o n’golo, como o uso de golpes com os pés enquanto as mãos
se apóiam no chão (chamado na capoeira de “meia lua de compasso” ou “de
rabo-de-arraia”), muito raro em outras artes marciais. Recentemente,
surgiram mais evidências desse parentesco. A viúva de Albano revelou
esboços e aquarelas inéditos, que ilustram estas páginas. Eles mostram
detalhes adicionais do n’golo: o apoio nos braços com uma perna dobrada e
a outra esticada para dar um golpe, por exemplo, é idêntico à
movimentação na capoeira. E a postura de defesa, com um joelho dobrado e
outro esticado, é muito parecida com a “negativa” dos nossos
capoeiristas. Como esses movimentos parecem existir somente em jogos de
combate da diáspora dos povos bantos, permanece relevante o vínculo
ancestral entre o n’golo e a capoeira brasileira.
O livro de 1972 foi publicado numa pequena edição caseira e circulou pouco na época. Mas as
XX imagens do n’golo – muitas vezes circulando via fotocópia de fotocópia – ficaram famosas entre os capoeiristas. O estilo de capoeira angola, que chegou a ser considerado em extinção na década de 1970, experimentou um extraordinário crescimento depois da morte de Mestre Pastinha. Uma nova geração de capoeiristas “angoleiros”, liderados por Mestre Moraes e o Grupo de Capoeira Angola Pelourinho – GCAP, revigorou o estilo a partir de 1982. Alunos mais antigos de Pastinha, como os mestres João Pequeno e João Grande, lembravam ocasionalmente a história do n’golo, mas não de maneira categórica, como seria feito por Moraes e seu grupo. O GCAP escolheu a dança da zebra como símbolo do estilo, porque representava bem a ancestralidade angolana da sua arte e também ia ao encontro das afirmações do movimento negro sobre a importância da cultura africana na formação do Brasil.
A partir da década de 1990,
o n’golo e as listras da zebra têm figurado nos logotipos e nos
websites de muitos grupos de capoeiristas, assim como nas camisas e nos
brindes distribuídos em seus eventos. Os detalhes fornecidos por Cascudo
e os desenhos de Neves e Sousa, repetidos e reproduzidos inúmeras
vezes, viraram referência obrigatória no meio. O n’golo acabou por
transformar-se num mito de origem, numa “tradição ancestral”.
No
entanto, trata-se de um mito no mínimo questionável. Para começar, não
foi transmitido pelos mestres africanos aos seus alunos brasileiros via
tradição oral. Aceitar literalmente o mito implica, além disso, um
tremendo anacronismo, ou seja: como pode uma manifestação documentada
apenas no século XX ser “a origem” de uma capoeira que existe pelo menos
desde o início do século XIX? Pensar que o n’golo teria sobrevivido
inalterado desde a época do tráfico negreiro é ignorar as profundas
mudanças pelas quais passaram as sociedades do território angolano nesse
período.
Surpreende que hoje, em Angola,
o n’golo seja completamente desconhecido, assim como seu papel como
mito fundador da capoeira. Devido à longa guerra civil que vitimou o
país e todas as transformações das últimas décadas, ninguém mais dança,
por exemplo, o n’golo de tchincuane (tanga de couro), como foi retratado
por Neves e Sousa meio século atrás. Talvez o mais correto seja
imaginar o n’golo e as outras lutas e jogos de combate ainda existentes
na Angola contemporânea como primos mais ou menos distantes da capoeira
brasileira. Findo o tráfico negreiro, as técnicas de combate corporal
que existiam dos dois lados do Atlântico teriam evoluído em direções
diversas, o que explicaria não só suas semelhanças, mas também suas
tremendas diferenças.
Por: Matthias Röhrig Assunção e Mestre Cobra Mansa pelo site da Revista de História
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.